CUOTIDIANO

quarta-feira, junho 16, 2010

O corredor

Quando ele achou que o corredor era dele e ela achou que o corredor era dela abriram as portas dos quartos saíram e evidentemente cruzaram-se rigorosamente a meio achando que o corredor era seu então algum deles perguntou tratas tu dos papéis ou trato eu? e o outro fosse quem fosse respondeu tratas tu já que tu é que queres! e tu não? sim quero mas tratas tu e pronto

Anos antes haviam caído na armadilha do cansaço e da rotina e do sai lá da casa de banho que estou com pressa. O beijo estava esquecido, a pele já nem existia e os ET’s que dentro transportavam haviam saído do mais fundo de si e, maquinalmente, faziam pequeno-almoço, sexo e transporte de crianças. Já nem sorriam.

Anos antes haviam-se amado, espalhado partes do corpo pelo chão enroladas em panos d’alma, revelado segredos em cada rolha de garrafa aberta, transformado sorrisos em lua cheia, escorrido corpos das palavras lembrando a vida a cada despertar, acordando a vida em cada adormecer de abraços. Sorriam. Muito.

Anos antes haviam-se conhecido, desconhecendo tudo um do outro mas acreditando na descoberta, nos cheiros, nas virgindades desnudadas pelos desejos – acreditando, até, numa estranha religião feita apenas de um Sol arrancado das entranhas da terra. Amavam. Muitíssimo.

Na 3ª secção de uma qualquer vara bastante criminal, um juiz passou a certidão. “Declaro o óbito às 10 horas e 12 minutos”. Saíram todos da sala com um ar fúnebre - mas aliviado. Então, de um modo extremamente competente, esfaquearam os sonhos – era da tradição - e o Amor, esse, foi enterrado pelo coveiro do Sol.

Fim.



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