CUOTIDIANO

sexta-feira, março 23, 2012

Parêntesis


(Será que ela aceita um copo?)
(Mas quem será aquele palerma que não pára de olhar para mim?)
(E se eu me aproximasse?)
(Não acredito – será que aquele totó vem ter comigo?)
(E se eu lhe perguntasse se ela acha que os biofísicos são uma espécie em extinção?)
(Mas que coisa mais estúpida… mas deu-me vontade de rir, confesso. Deverei aceitar o copo?)
(Olha, ela aceitou, a estupidez compensa! Será que me aguento à bronca?)
(Não estou a pensar dizer-te o meu nome, tens alguma coisa contra?)
(Não, nada, absolutamente nada, desde que eu também possa continuar assim, anónimo. Pode ser?)
(Claro, até prefiro. Já agora, pode saber-se porque é que, a esta hora, ainda aqui andas?)
(Por ti! Pode ser?)

Os corpos estavam nus, abraçados, moviam-se ao ritmo certo da música que haviam ouvido – sentido? -, na cadência do amor mera e excelsamente temporário que sentiam e que sabiam existir entre eles, se calhar talvez fizessem amor, talvez dançassem, talvez tomassem banho agitando o braço do duche como se deles - humanos, carentes -, se tratasse, marcando o ritmo, marcando o desejo, suando o medo do dia seguinte mas, simultaneamente, afogando-o na coragem alcoólica do momento. E a banheira enchia e as canções do passado invadiam o momento, cada vez mais estranho, cada vez mais possuído, catártico, libertador. Como ele a amava. Como ela o amava. Mas apenas e só naquele momento único e que, portanto, passou a ser tudo o que interessava – e, mais portanto ainda, eterno. E não é que as velas se acenderam sozinhas? Portentosamente?

(Acordei. Será que ela se lembra de mim?)
(Acordei. Vou fingir que ainda durmo, pode ser que ele se vá embora. Mas será que o quero?)
(E se eu saio agora, será que a reencontro? Será isso que quero?)
(Pira-te, sacana, não vês que gostei de ti?)

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