CUOTIDIANO

sexta-feira, outubro 14, 2011

João Nuno de Almeida Reis Hipólito



Soube hoje da morte do João Hipólito. Do Prof. Dr. Eng. João Nuno de Almeida Reis Hipólito. Do Joãozinho. Do Hipólito.

Num só morreram muitos, nestas graçolas parvas de vários em um que a Morte resolve pregar inspirada nos champôs. Ele estava numa reunião, falava, sorria, fazia os outros sorrir e pensar (sem darem por isso, como ele sempre fazia) e, como se de uma última piada se tratasse, caiu para o lado. Com ele morreu o Amigo, o Homem, a Criança, o Professor que eu já não via há anos – demasiados anos, como são todos os minutos que se passam longe das pessoas que estimamos desde a alma.

Foi o meu “mentor”, o meu primeiro “chefe”,

(qualquer designação destas que eu lhe dê fica sempre entre aspas, pois não só soa mal como nunca diz exacta e completamente o que o Hipólito era)

quando comecei a dar aulas na faculdade. Tinha uma paciência infinda para o puto (eu, no caso), sempre (bem-)disposto a ajudar e as aulas dele a que eu era teoricamente obrigado a assistir para preencher os requisitos de “escravo de 1ª categoria”, eram momentos de um prazer enorme – não só pela forma como explicava as matérias mais complexas, tornando-as evidentes, como pela empatia e cumplicidade que criava com os alunos que, quisessem ou não, saiam dali a gostar daquilo, por mais arrependidos que ficassem umas horas depois.

Mas também, no Departamento, fizemos umas incursões nocturnas, mais ou menos escabrosas, e o Hipólito era o “motor” da noite,

(tudo o que o designa continua entre aspas – eu não disse?)

sempre a alegrar os espíritos, com todo o seu humor e inteligência e humor inteligente, elevando-nos – com a ajuda do álcool, é certo - muito acima do estado lamentável em que já estávamos – também com a ajuda do álcool, é certo outra vez.

Sempre me acompanhou no meu percurso académico posterior, mesmo não sendo ele o meu orientador oficial e estando teórica e formalmente desobrigado de me acompanhar. Mas era ele a quem eu recorria sempre que tinha dúvidas ou problemas, era ele quem me aconselhava desinteressadamente, quem eu sonhava que seria algo como eu mas em ponto grande – aliás, sempre tive a esperança que ele achasse que eu era o Hipólito em ponto pequeno. Nunca lho perguntei e agora já é tarde demais.

Seja como for o tempo passou, nós fomos passando, afastando-nos, gerúndio após gerúndio, ano após anos. Por isso mal acreditei quando, no meio do almoço de hoje, soube, por mero acaso, o que se havia passado. De imediato regressaram à memória todos os momentos, tudo o que nos vai sobrando da vida que não é mais do que o instante em que tocamos e somos tocados por alguém, no mais “almário” sentido do toque.

No momento fiquei sem palavras, agora fiquei sem ar mas – a verdade é essa – é que amanhã e depois e depois e depois ainda fiquei sem o Amigo, o Homem, a Criança, o Professor, quem eu nunca mais vi julgando que, a qualquer momento, poderia voltar a rever e que, agora, sei que não mais reverei.

Por isso tudo e mais o peso na consciência e mais a saudade e mais a vontade completamente inútil de me sentar contigo a beber um copo (a) mais, deixo-te um abraço, um até sempre e, como um absurdo grito de guerra, deixo o teu nome rasgado no ar, com a perenidade da água que passa mas com a memória que a mesmíssima água deixa. Onde quer que estejas, aqui vai ele:

HIPÓLITO!

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2 Commenários:

  • "Perdas sem aviso" deixam "um espaço no coração sem matéria". E mesmo com aspas nada disto o sabe dizer. Nada disto sabe o que diz. Mas di-lo assim só porque o sente.

    By Blogger APC, at 28 de novembro de 2011 às 10:33  

  • Fui colega do João Hipólito no Colégio Vasco da Gama, em Nampula, e no Liceu Salazar, na então Lourenço Marques, hoje Maputo. Só hoje soube da sua morte e daqui envio um abraço à Isabel Ferreira, sua mulher e também nossa colega, quer em Nampula quer em Lourenço Marques. Todas as palavras são poucas para falar do João: aluno de 20 valores em quase tudo, também fazia sucesso entre as colegas, que disputavam a sua atenção. Até sempre João. José Fátima


    By Blogger jose oliveira, at 28 de março de 2016 às 15:55  

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