CUOTIDIANO

sábado, julho 12, 2008

Último dia de trabalho

Chegou ao fim do último dia de trabalho. Despediu-se dos colegas - alguns também amigos - por entre lágrimas furtivas, evitou o Dr. Engº. Arqº. Comendador Professor General para quem trabalhava há tantos anos (para quê uma última chatice?), arrumou a secretária e veio-se embora, num misto de alívio e angústia. Tinha dado tudo de si àquela firma e, dali, só lhe sobravam, na melhor das hipóteses, alguns momentos, algumas imagens. Tantos anos haviam passado, tanto passado havia naqueles anos...

(E daquela vez em que...)

Deixou as chaves poisadas na mesa da entrada e fechou a porta atrás de si. Virava uma página.

Desceu no elevador. Tomou um último café no sítio do costume - que em breve deixaria de ser “do costume” para passar a ser apenas “um sítio” – e seguiu a pé para a estação. Apanhou o comboio.

Chegou a casa. Ao passar pelo velho espelho da sala, hesitou. Voltou atrás. Olhou-se e... sorriu. Sorriu porque observava que o seu tempo era, a partir dali, total e completamente seu. De facto, começava naquele preciso instante uma outra vida, a partir daquele exacto momento apenas nas suas mãos, as mesmas mãos que foram enrugando no escritório, por entre os papéis sempre trocados das nossas vidas.

Sorriu de novo. Depois, estranhamente, começou a rir, depois ainda riu-se mais, depois mais ainda, até que riu como nunca antes se havia ouvido, num riso que, de tão estridente e livre e genuíno, era apenas comparável ao choro de um parto.

Não virava uma página – começava, afinal, a escrever um novo livro em que, finalmente, era ela a personagem principal.


PS – Este post é dedicado a uma Senhora que se reformou a semana passada e a quem estou e estarei para sempre grato, não só por tudo o que me tem aturado ao longo dos anos como pelo privilégio e honra que é deixar-me ser seu amigo. Curiosamente, a nossa “ligação” começou numa daquelas estranhas graçolas do destino, pois começou a trabalhar (na firma de onde agora se reformou) no preciso dia do meu nascimento. Esse nosso “elo” foi retomado cerca de vinte anos depois, quando para lá também fui trabalhar e, desde aí, para mim tem sido sempre um exemplo de como podem conviver seriedade, educação e profissionalismo com amizade, afecto e solidariedade. Como disse, uma Senhora, que ainda tem muito para dar a todos aqueles que, como eu, têm a suprema sorte de com Ela conviver.

PPS - Para além de ser um ganda borracho, claro! (Tinha de ajavardar, já me conheces Gigi!)

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