CUOTIDIANO

quarta-feira, setembro 09, 2009

Um isqueiro

Ao tirar um livro da estante, sem querer fiz cair ao chão um isqueiro que estava – vá lá saber-se porquê – poisado nele.

Era o último resquício de ti – sim, era teu, tinha de ser que eu não fumo –, tu que não quiseste que eu ficasse com nada relacionado contigo, nem a mais leve recordação ou toque a desvanecer; tu que, imediatamente antes de partires, fizeste uma ronda pela casa, desinfectando-te dos móveis, dos objectos, das fotografias, das lembranças, do tempo, das imagens, dos prazeres.

Enquanto o isqueiro voava, lembrei-te na praia, em nudez de onda e maresia (está quase no chão), lembrei-nos no banco da frente do carro a fazer amor porque era urgente ou apenas porque sim (está quase, mas agora mesmo quase no chão), lembrei-me entrelaçado em teu corpo enquanto a noite, grávida de estrelas, surgia só e exclusivamente por ti (quase, quase, no chão) – lembrei, lembrei tudo.

Quando, finalmente, o isqueiro caiu, apanhei apenas o barulho. Quanto ao isqueiro, deixei-o no chão para que, no dia seguinte, inadvertidamente, tropeçasse em ti. E te dissesse que ainda te amo.

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