CUOTIDIANO

terça-feira, maio 07, 2013

Ao Sol de África

  

O Sol de África parecia que brotava do chão, ainda sujo de raízes e terra, sacudindo-se, enquanto se erguia. Era vermelho, de um vermelho que não se encontra na Europa por mais que pintores e marketeers se esforcem, de um tamanho que mais parecia uma nave extraterrestre preparando-se para regressar a um qualquer planeta distante - eventualmente imaginário, mas seu.

Bola de fogo é pouco para o definir. A verdade é que a sensação era a de uma bola de fogo propriamente dita entrando-nos pela boca, narinas, ouvidos, até que nos enchesse por completo a alma de espanto e calor. E então ficávamos a olhar, perplexos, como se da primeira vez, como se de um parto de felicidade e encantamento se tratasse. Como se ele nos renascesse e redimisse das múltiplas mortes da noite.

Com um amanhecer daqueles, nem poetas se lembrariam de divagar sobre estrelas e a profundeza dos céus – não, o Sol ocupava todo e qualquer espaço, mental e físico. E espaço é coisa que não faltava – nem falta – em África. Parámos o jipe, não dissemos palavra, e esperámos sabe-se lá o quê, olhando, aquecendo, esperando que ele se erguesse, definitivo e nobre por sobre nós, aquecendo, enquanto os sons estridentes dos animais celebravam o seu regresso – ele que na véspera, generosamente, havia ido distribuir gotas de si próprio para outros lados, qual leiteiro do século XIX, porta a porta, “quanto é que deseja, 230?”, na sua forma doce e peculiar de aquecer corações pelo Mundo fora.

Éramos putos e era o tempo de sermos despreocupados. Tínhamos tempo para olhar o Sol e tudo o que interessa. Tínhamos tempo e todo o espaço de África.

E o Sol era nosso.