CUOTIDIANO

sábado, julho 26, 2008

O Funcionário Certo

Sento-me em frente à televisão. Ligo. Primeira emissão de um novo concurso da RTP1.

Entra o apresentador.

Aplausos do público presente e de 7 donas-de-casa acabadinhas de passar a ferro.

Voz off – ... e como anfitrião de mais um grande programa de entretenimento... Jorge Pincel!

Aplausos do público presente e de, agora, apenas 6 donas-de-casa acabadinhas de passar a ferro, já que a que falta foi fazer chichi com o João Baião.

Jorge Pincel – Boa tarde. Como todos sabemos, existe em Portugal um desporto imensamente popular que, curiosamente, é muito pouco divulgado. No entanto, e orgulhando-nos nós, na RTP1, de prestar serviço público de qualidade duvidosa, esta bela actividade terá, aqui, o tratamento que verdadeiramente merece. Trata-se quase que do equivalente português à caça à raposa em Inglaterra e corresponde à normalmente exasperante tentativa de contactar um funcionário público. Sim, meus senhores e minhas senhoras, vamos ter aqui, ao vivo e semanalmente, “O Funcionário Certo”!

Aplausos do público presente e de 10 donas-de-casa acabadinhas de passar a ferro, porque têm a mania de se reproduzir sempre que em cativeiro.

Jorge Pincel – As regras são simples: Cada concorrente terá um telefone à sua disposição e tentará contactar um funcionário público, aleatoriamente escolhido pelo nosso computador. Terá direito a três telefonemas e, em cada um deles e consoante o respectivo resultado, haverá as seguintes sete hipóteses de pontuação:

1 – O telefone toca mas ninguém atende – 0 pontos;
2 – A telefonista diz que não consegue contactar o funcionário e que o melhor seria telefonar mais tarde – 1 ponto;
3 - A telefonista diz, igualmente, que não o consegue contactar mas que, no entanto, conseguiu falar com um(a) colega que, por sua vez, lhe transmitiu que o casaco estava lá – 2 pontos;
4 – Igual à anterior mas a telefonista consegue efectivamente falar com o casaco – 3 pontos;
5 – A telefonista transmite-lhe que ele (o funcionário, não o casaco) está em reunião mas, mesmo assim, você consegue deixar recado – 5 pontos;
6 – Chega à fala com o/a colega do lado – 7 pontos;
7 – Fala (mesmo!) com o funcionário pretendido – 20 pontos.

Chamamos à atenção, ainda, para três situações particulares:

- Desde um hora antes da de almoço e até duas horas depois, as pontuações dobram;
- Se o funcionário estiver a beber café aquando da chamada, as pontuações serão metade;
- Se o telefonema decorrer durante o cio, quando têm de sair dos gabinetes para tentar acasalar e são vistos e chamados nos corredores, a pontuação obtida será, apenas, de um terço da que se obteria em condições normais.

Vamos jogar ?

Aplausos do público presente e de 100 donas-de-casa acabadinhas de passar a ferro, porque são extremamente eficazes a reproduzir-se em cativeiro.


(Tento mudar de canal mas o comando não obedece – chiça, o jogo continua!...)

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sábado, julho 19, 2008

Bourbon

Últimas palavras de Humphrey Bogart antes de morrer:
“Nunca deveria ter mudado do whisky para o martini.”

Voltava de Madrid, onde me tinha ido encontrar com um papagaio bipolar. Apesar do Espaço Schengen, das fronteiras abertas e do cozido à portuguesa, fui mandado parar por um polícia fronteiriço - uma espécie que, julgava eu, já estaria em extinção, conjuntamente com o gelo do Pólo Norte, a Amazónia e o Político Honesto.

- Tem alguma coisa a declarar?

- Não, nada.

(Aliás, nem quando pedi a minha ex-mulher em casamento me declarei – dei-lhe apenas a minuta do contrato e um beijo mal dado.)

- Desculpe, mas dá bem para ver que transporta emoções. E não as declarou!

Estava tramado. Era verdade. E, ainda por cima, o sacana estava-se a borrifar para os caramelos da Viúva Solano

(que, coitada, deve ser viúva à brava, já que passa o tempo todo a fazer caramelos, no que será a única forma que conhece para esquecer o marido, o defunto Sr. Solano)

e fixava-se nas minhas emoções. Que grande azar! E, para cúmulo, era um gajo!

- Pois é, agora vai ter de pagar imposto sobre as importações!

- Mas eu já transporto comigo estas emoções desde há muito tempo, já as trazia desde que saí de Lisboa, porque carga de água é que vou pagar imposto sobre as importações?! Ainda se estivesse apaixonado por uma espanhola qualquer que me tivesse agora abandonado, eu perceberia – mas assim, com as mesmas emoções de há mais de dez anos... O Sr. guarda não vê que estas emoções estão gastíssimas, até já em muito mau estado?

- Sim, vejo, mas não deixam de estar em belíssimas condições de uso. Daí o pagamento de imposto.

Sacana! Tinha razão! De facto, era impossível esquecê-la!

Paguei e vim-me embora - mas nunca mais me apanham descalço já que, em Elvas, dei boleia a uma espanhola ressacada e, a partir daí...

(Ou seria um papagaio bipolar? Chiça, vou ter de largar o Bourbon!)

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sábado, julho 12, 2008

Último dia de trabalho

Chegou ao fim do último dia de trabalho. Despediu-se dos colegas - alguns também amigos - por entre lágrimas furtivas, evitou o Dr. Engº. Arqº. Comendador Professor General para quem trabalhava há tantos anos (para quê uma última chatice?), arrumou a secretária e veio-se embora, num misto de alívio e angústia. Tinha dado tudo de si àquela firma e, dali, só lhe sobravam, na melhor das hipóteses, alguns momentos, algumas imagens. Tantos anos haviam passado, tanto passado havia naqueles anos...

(E daquela vez em que...)

Deixou as chaves poisadas na mesa da entrada e fechou a porta atrás de si. Virava uma página.

Desceu no elevador. Tomou um último café no sítio do costume - que em breve deixaria de ser “do costume” para passar a ser apenas “um sítio” – e seguiu a pé para a estação. Apanhou o comboio.

Chegou a casa. Ao passar pelo velho espelho da sala, hesitou. Voltou atrás. Olhou-se e... sorriu. Sorriu porque observava que o seu tempo era, a partir dali, total e completamente seu. De facto, começava naquele preciso instante uma outra vida, a partir daquele exacto momento apenas nas suas mãos, as mesmas mãos que foram enrugando no escritório, por entre os papéis sempre trocados das nossas vidas.

Sorriu de novo. Depois, estranhamente, começou a rir, depois ainda riu-se mais, depois mais ainda, até que riu como nunca antes se havia ouvido, num riso que, de tão estridente e livre e genuíno, era apenas comparável ao choro de um parto.

Não virava uma página – começava, afinal, a escrever um novo livro em que, finalmente, era ela a personagem principal.


PS – Este post é dedicado a uma Senhora que se reformou a semana passada e a quem estou e estarei para sempre grato, não só por tudo o que me tem aturado ao longo dos anos como pelo privilégio e honra que é deixar-me ser seu amigo. Curiosamente, a nossa “ligação” começou numa daquelas estranhas graçolas do destino, pois começou a trabalhar (na firma de onde agora se reformou) no preciso dia do meu nascimento. Esse nosso “elo” foi retomado cerca de vinte anos depois, quando para lá também fui trabalhar e, desde aí, para mim tem sido sempre um exemplo de como podem conviver seriedade, educação e profissionalismo com amizade, afecto e solidariedade. Como disse, uma Senhora, que ainda tem muito para dar a todos aqueles que, como eu, têm a suprema sorte de com Ela conviver.

PPS - Para além de ser um ganda borracho, claro! (Tinha de ajavardar, já me conheces Gigi!)

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quarta-feira, julho 09, 2008

Assim não Vale!

Vale e Azevedo, depois de ter gamado prédios e milhões (e talvez meias) em burlas a meio mundo, vive à grande e à inglesa numa mansão com mordomo e outras mordomias, passeando-se pelas ruas de Londres num Bentley topo de gama, com chofer e champanhe. Entretanto, por entre festas e offshores, vai-se rindo da justiça portuguesa.

As “Águas de Portugal” acumularam prejuízos de centenas de milhões e estão à beira da falência. Entretanto, e para comemorar os seus grandes actos de gestão empresarial, os administradores atribuíram-se em prémios alguns desses milhões.

O PCP, em mais um delírio absurdo, acha que os criminosos que vivem do rapto e do tráfico de droga na Colômbia - e que retiveram (e retêm) em cativeiro na selva vários prisioneiros, entre os quais a agora salva Ingrid Betancourt (que, no comunicado do PCP, aparece como “Bettencourt”...) -, são um movimento de libertação. Entretanto, também acha que o governo colombiano, democraticamente eleito, é o sustentáculo de um regime neofascista.

Depois do Menino Guerreiro que foi (o saudosíssimo!) Santana Lopes, temos agora o Menino de Ouro do PS, a biografia de José Porreiro Pá Sócrates. Entretanto, cuidado meninos: agora anda aí à solta a Múmia Reciclada!

O Ministério da Educação, conforme todos testemunhámos e tudo o que era especialista na matéria o confirmou, fez uns exames facílimos e as negativas a Matemática passaram para metade de um ano para o outro. Mas será que alguém no seu perfeito juízo (a ministra não conta!) acha que é possível que, num ano, qualquer reforma que seja (e mesmo que boa) surta efeito – e ainda por cima de uma forma tão espectacular?! É o que temos – “trabalha-se” para a estatística e não para o conhecimento... entretanto, os alunos ficam cada vez mais ignorantes, claro. (E eu que gostava desta ministra...)


Mas enfim, nem tudo é mau - os Delfins vão acabar!

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