CUOTIDIANO

sábado, março 31, 2007

Cinzas de ti

Olhaste pela janela
Como se tivesses
Perdido uma parte do Mundo
Acendeste um cigarro
Como se quisesses
Voar no próprio fumo

Esboçaste um sorriso
Pagaste a conta partiste
Deixando-me apenas as chuvas de Janeiro
E enquanto ruas e sombras te engoliam
Cinzas de ti ainda ardiam
No cinzeiro

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sexta-feira, março 23, 2007

...que é como quem diz

Como quem diz alguma coisa, nada te disse – dei-te o som de palavras indecisas em vez de mãos apertadas, troquei sonhos em vez de olhares, comprei esquecimentos ao preço de vontades – como num entrelaçado silêncio de vozes, disse-te “olá” no mesmo e preciso instante do adeus. Melhor - como numa estranha forma de nada dizer mas dizendo, estranhamente calei o quanto te amava.

Outra vez. Como quem diz alguma coisa, nada te disse - enquanto as palavras voavam pelas noites, serpenteando estrelas para, de manhã, se entreterem apenas a embalar os dias nado-mortos.

Até que, um dia, olhei as minhas mãos – eram feitas de retratos de tempos e barcos e losangos e nuvens; tantas coisas mas, sem ti, vazias. Só aí, verdadeiramente, me apercebi que te havia amado muito mas muito para além das putas das palavras!

Nesse momento, morri. E, desde aí, limito-me a navegar silêncios.

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domingo, março 18, 2007

Tão culto, de tão culto que era...

Que arrotava, apenas, em francês
Só comia sopa de letras
E tinha uma enciclopédia como almofada
Por azar passou um camponês
Com fome e a borrifar nessas tretas
E comeu-o sem deixar mesmo nada

- É para aprender a não se deitar entre duas fatias de pão – disse, sobranceiro, um cão.

quarta-feira, março 14, 2007

Notícias avulso que, por azar, fui retendo

Fontão de Carvalho, o vereador responsável pelas finanças da Câmara Municipal de Lisboa “auto-suspenso” após ter sido constituído arguido por peculato há vários meses - mas que o não revelou a ninguém na altura porque, simpaticamente, não queria incomodar -, quando questionado sobre o “buraco” de 300 milhões da Câmara respondeu algo como “até Fevereiro, quando eu saí, as finanças estavam controladas”. Bom, mas afinal Lisboa começou a gastar 10 milhões por dia no último mês, eventualmente em festas comemorativas da sua saída? Ou ele nunca tinha dado por isso porque olhava sempre para o lado, enquanto assobiava? Recordo que este é o mesmo vereador que tem tido o pelouro das Finanças neste e nos mandatos anteriores, já tendo sido eleito tanto pelo PSD (actualmente) como pelo PS e pelo CDS. Conclusão: nas próximas concorre pelo Bloco de Esquerda e resolve todos os problemas económicos, incluindo os subornos ao Sá Fernandes.

Courtney Love, a viúva negra de Kurt Cobain, após centenas de desacatos e confusões normalmente provocados por excesso de droga e falta de juízo, foi condenada a pagar vários milhões em indemnizações ou, em alternativa, a uma cura de desintoxicação e menos milhões. Agora, passadas algumas semanas de internamento e dando-se como curada, pirou-se sem pagar a conta, de vários milhões também. Conclusão: fuma um charro que isso passa.

Luís Filipe Meneses, o Santana Lopes em versão tripeira, conseguiu demonstrar que a votação do referendo ao aborto – conjugando votantes com abstencionistas e mais umas coisas que lhe disse, a ele e à Alexandra Solnado, o próprio Jesus Cristo – deu 80% a favor do “Não”. Conclusão: Luís Filipe Meneses é o aborto mais imaginativo de Portugal.

Paulo Portas, aquela coisa bronzeada que acha que espernear é viver, voltou – curiosamente, sem nunca ter partido - porque quer o seu partido de volta. A razão é simples: a bola é dele e já está farto de ver os outros meninos a brincar com ela. Conclusão: Afinal há abortos mais imaginativos que o Luís Filipe Meneses.

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sexta-feira, março 09, 2007

Gostaria de acordar com um telefonema teu

... nem que fosse como “prémio de consolação” de não ter conseguido conquistar-te na véspera ao ponto de teres dormido e acordado comigo; enfim, pelo menos havia conquistado o suficiente de ti para te teres lembrado, se não de mim, pelo menos do meu número de telefone – já não seria mau! Ou melhor, seria mais que suficiente para que, num qualquer amanhã, tentasse outra vez conquistar-te o abraço e o suor e o desejo e o corpo e a doce maresia das mentiras e dos sonhos.

... tudo isto a propósito de hoje ter acordado com a histeria do despertador - que chatice, a realidade.

Porra!

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8 de Março

Ao almoço, comecei por tentar comer a sopa só com o garfo. Foi lixado.

No prato principal, reconheço, foi de caretas.

Na sobremesa (pudim) já foi complicado outra vez – tive, claro, de recorrer à la pate.

... e tudo isto por respeito à data - assim, sempre estava a poupá-las, não é?

Bom, para dizer a verdade, não só por respeito à data mas, principalmente, por surdez – de manhã julguei ter ouvido que era o Dia Mundial da Colher.

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quinta-feira, março 01, 2007

O síndroma de Agostinho

Joaquim Agostinho foi, como toda a gente sabe (ou deveria saber, que um pouco de cultura desportiva nunca fez mal a ninguém...), o melhor ciclista português de todos os tempos. No entanto, como nunca chegou ao “topo dos top’s” – ficou apenas em terceiro na “Volta à França” -, e à conta da nossa angústia congénita e colectiva da fase pós-descobrimentos (na qual temos vindo a descobrir que, afinal, não somos "os maiores"), criou-se a frase “passou ao lado de uma grande carreira”.

Comigo é semelhante – na adolescência fiquei em 4º num concurso de máscaras com prémios até ao 3º (apesar de, por breves horas, ter sido uma espanhola linda!), quando julguei ter ganho a lotaria havia sido gralha do jornal, aos vinte e poucos ganhei o 6º prémio do concurso literário, na altura anual, do "DN Jovem", com prémios até ao 5º (enfim, sempre apareci no jornal...), o meu lugar na garagem do prédio é o 68, namorei com uma rapariga que era quase a Kim Bassinger, enfim... sempre por pouco.

Vem tudo isto a propósito da palerma (sim, “palerma” é um termo lindo!) da nossa vida, sempre paralela a nós mesmos, sem nunca ser o que desejamos mas suficientemente próximo para que possamos dizer “estou lá quase”. O problema é que do “nada” ao “quase” vai a mesma distância que do “quase” ao “tudo”! Ou seja, imeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeenso!

Outra característica fantástica deste síndroma é o “empurrar” de fronteiras – nunca assumimos que algo está mal, limitamo-nos a empurrá-la. Ou seja, quando concluímos que algo está mesmo mal, logo mudamos o limite – “afinal é mais além”; e lá seguimos com a “vidinha”, esperando por novo e inevitável empurrão de fronteira (“afinal, talvez nem nada esteja tão mal assim...”)

Resumindo: por pouco não somos alguém, por pouco não somos alguém nem que seja para outro alguém - por pouco nunca seremos alguém. Por outras palavras: enquanto no mundo real há um “ninguém” que ocupa o nosso lugar, qual extraterrestre usurpador da pele alheia, no mundo virtual em que conseguimos sobreviver vamos dando os passos (virtuais, claro!) que achamos brilhantes mas que nos vão sempre e só desvirtuando a existência - curiosamente, são exactamente os mesmos que achamos que vão dando sentido às nossas vidas absurdas. Como no anúncio, há coisas fantásticas, não há?

Tudo isto a propósito de nunca me teres abraçado. Mesmo.

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